Sunday, November 15, 2009

Diante da janela, o roseiral

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Testamento enterrado

à sombra do roseiral:

Deixo meu violão

para a balconista da padaria.

A erva benta

para a velha do sobrado.

A chaleira

que chia Villa-Lobos

para Frei Gustavo,

que costura almas

nas manhãs de quarta.

O livro de poesia

de Augusto dos Anjos,

para o cobrador do expresso 022.





Assinado:
A menina dos olhos tristes.

Chico me chamava de Carolina,

mas era só um disfarce.

Sou eu a menina

que viu o tempo passar na janela,

sem ver.

Bárbara Lia
in O SAL DAS ROSAS

estante #29


Um simples atraso

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"Não canterei o riso que não rira
E que, se risse, ofertaria aos pobres"
Carlos Drummond de Andrade


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Cheguei atrasado para a festa da vida e da morte.
Cheguei em companhia de quem nem conhecia. Mas, mesmo assim, mesmo estando só, mesmo estando só de passagem, fizeram-me esperar à porta.
O riso, não celebrado, não aconteceu de novo.
E tudo ficou tão tarde. Desejei passear um pouco lá fora e acompanhar o cortejo das árvores.
Tranquei-me sujo com o mijo escuro da noite.
Tranquei-me com mil pássaros.
Tranquei-me com um pouco da própria carne entre os dentes.
Meu medo, enfim, por fim, sem riso celebrado, desencabulou-se e saiu de casa. Foi apanhar-me no meio da rua.
Bernardo Brayner
Exercício de Morrer
Editora LivroRápido, 2005

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