Nome peculiar - Patrocínia. Musa do pai que morreu de amor quando ela morreu aos 69 anos, eu tinha 36 anos apenas. Minha melhor amiga desde que existo. Nó na garganta. Para mim tem a mesma luz das mulheres nas quais me espelho. Longa história de vida a nossa. Um livro que vou compor com os pés naquela cozinha rústica meio ao aroma de suas deliciosas comidas e os seus conselhos. Antiga aura de mãe, sempre plena de preocupações. Até aqui alguns versos poucos, não equivale ao imenso amor... Não retrata a pessoa. Quem sabe um dia consiga escrever seus olhos da cor do mel... Meu pai dizia que lembrava os olhos das onças - amarelos. A sua natureza silenciosa. A pessoa que - literalmente - colocou-me em pé quando o vírus da poliomielite me atingiu. A força dela permitiu que eu vivesse assim, quase normal, para realizar meus sonhos e para estar ao lado dela até o fim.
Fazes falta mãe! Os provérbios
às centenas. “Não dê pérolas aos porcos”. Nunca ouvi a sapiência nata e rude
cheirando à capim antigo. Seu rosário de infinidades. A gota d’água. A gota d’água.
A gota d’agua. A gota que estoura o dique. Cessem a chuva de cólera. Eu só
quero deitar-me aos pés do arco-íris. Beijar seus dedos róseos. O resto? O
resto não importa. Nem as pérolas; Nem os porcos.
in O sal das rosas (2007)
Sol no cio
A mulher coloca a laranja-da-terra no orvalho
Corta o mamão verde em talhos,
esquenta o tacho em ternura e açúcar
Mexe até que torne sol transparente no cio
ou verde-éden passeando no céu da boca...
Também ela translúcida e doce
Minha transparência retira véus e inaugura farpas
Não sei tornar frutas verdes em delícias vítreas
Não deito no fogo o espírito indócil.
Não aprendi com ela a por as dores de molho no orvalho
a calar as palavras que derrubo no mais amado
como um branco leite de fogo sem juízo
E isto é tudo o que sonho:
Ser bela morena ao redor do tacho
mudando o duro amargo das frutas e das horas
em verde-éden passeando no céu da memória
e sol no cio desnudando labaredas de açúcar
Corta o mamão verde em talhos,
esquenta o tacho em ternura e açúcar
Mexe até que torne sol transparente no cio
ou verde-éden passeando no céu da boca...
Também ela translúcida e doce
Minha transparência retira véus e inaugura farpas
Não sei tornar frutas verdes em delícias vítreas
Não deito no fogo o espírito indócil.
Não aprendi com ela a por as dores de molho no orvalho
a calar as palavras que derrubo no mais amado
como um branco leite de fogo sem juízo
E isto é tudo o que sonho:
Ser bela morena ao redor do tacho
mudando o duro amargo das frutas e das horas
em verde-éden passeando no céu da memória
e sol no cio desnudando labaredas de açúcar
***
Se eu pudesse ter o presente impossível pediria os olhos mel de minha mãe. Eles me viam inteira - um cata-vento topázio eclipsando o cinza. Sem o mel que me cobria em alguns dias sou cinza; em outros - cata-vento
e entre eclipses sazonais: topázio.
in A última chuva (2007)