Saturday, November 06, 2021

Adeus Karuguá - Bárbara Lia

 

 (Matéria para o Site - Vejo São José. Em 2006 atuei como jornalista cobrindo a COP8. Quinze anos passados e segue tudo como era dantes no quartel de Abrantes. Greta Thunberg era praticamente um bebê em 2006).


Ampulheta colocada no hall de entrada do Expotrade Convention Center pelos integrantes do Programa do GreenPeace (Kids for Forest). Dentro, os animais se transformando em dinheiro e o pedido para que virassem a ampulheta ao contrário.

 


A MOP3 começou com uma recepção no Memorial de Curitiba – Largo da Ordem. Três semanas depois, as delegações, ONG’s, jornalistas, Ministros de Estado e até mesmo o Presidente da República deram sua contribuição para colorir Curitiba das cores da Terra e da Esperança. À uma hora da manhã deste sábado (1º de abril) quando se encerrou a última reunião o futuro da Terra, em sua essência mais complexa, foi discutido e dissecado. Ao final, ao que parece, sem merecer o devido cuidado, a primordial atenção e por mais que os integrantes da Convenção, na figura do seu secretário Ahmed Djoglaf faça uma avaliação positiva, ressaltando que houve um grande entendimento e muita sintonia entre os Ministros de Estado presentes, não há muito a comemorar. Ahmed enfatizou a presença de quatrocentos jornalistas, ainda assim, ao menos para esta observadora, o momento merecia muito mais atenção da grande mídia, da população, que se escora em divagações quando questionado sobre o tema. Ouvi de uma pessoa: até lá já morri. Ouvi isto quando comentei sobre a conclusão dos mil e trezentos cientistas que responderam ao pedido da ONU e fizeram um relatório sobre a saúde do planeta. Eles colocaram a possibilidade de dentro de trinta anos o planeta entrar em convulsão, caso nada seja feito a respeito da questão do meio ambiente. Então, quando alguém te responde com esta lacônica previsão – Até lá eu já morri - percebe-se a dificuldade que irão encontrar governos, ONGS, ambientalistas e qualquer um que pense o futuro das espécies e a saúde da Terra: a inércia.

 



Durante alguns dias este ônibus decorado com borboletas nos levava ao MOP/COP – A biodiversidade está na gente – escrito em dois idiomas.

 

No início, na primeira semana o tema girava em torno de duas sentenças: “contém”, e “pode conter” – os chamados transgênicos, ou organismos vivos modificados. A máquina que usei para fotografar estava com a data errada, quiçá em 2.023 borboletas reais circundem os ônibus e comemorem outra mentalidade. A questão da MOP3 levou o Governador Roberto Requião a dizer em um dos seus pronunciamentos “O eufemismo falso do – pode conter- se transportado para um programa de governo, por exemplo, comportaria a dedução de que o programa de governo pudesse ser rotulado como - pode conter interesses contra a Ecologia”.

Do lado de fora da Expotrade, em tendas brancas, acontecia paralelamente o Fórum Global da Sociedade Civil, que teve a participação da Ministra Marina Silva e do Governador Requião na abertura do Fórum.  O evento reuniu ONG’s, Nações Indígenas e integrantes da Via Campesina.

A MOP3 teve avanços na negociação da rotulação definitiva do termo “contém”, muito embora esta prática só entre em vigor em 2.012. Segundo Marina Silva “O protocolo de Cartagena é cumulativo e o que fizemos aqui foi colocar o “contém” na ordem do dia, nos países que são parte do Protocolo”.

Ao final da MOP o Governador do Paraná – Roberto Requião – tomou à frente e assinou um decreto onde, a partir de agora, os produtos paranaenses vão receber o selo “contém OVM’s”, atitude elogiada pela Ministra e por vários integrantes do evento.

Finda a MOP3, a Convenção da Biodiversidade teve início com a chegada à Curitiba de várias etnias, fazendo do Centro de Convenção um lugar onde desfilavam os trajes típicos de várias nações e os povos indígenas de sessenta países presentes. No pátio realizavam cerimônias, diante das ocas montadas, atraindo os visitantes.

 



Cavalhadas

 

Em três noites, durante a COP, aconteceu uma encenação com mais de mil integrantes, do grupo – Ordem dos Cavalheiros – da cidade de Guarapuava (PR), interpretando o espetáculo conhecido como “Cavalhadas”, reproduzindo lutas da Idade Média.

Durante a COP a taxa de ocupação hoteleira em Curitiba alcançou a taxa de 70%, contra 30% no mês período no ano de 2.005.

Dentro, as negociações giravam em torno de temas importantes como a questão da repartição de benefícios e acesso a recursos tradicionais, e a utilização ou não das Terminators.

O Fórum Internacional Indígena sobre Biodiversidade (FIIB) fez críticas aos resultados no último dia do evento - a 8ª Conferência das Partes da Convenção sobre Diversidade Biológica (COP-8). Segundo os participantes do Fórum “não avançou na construção de um regulamento internacional para o acesso a recursos genéticos e conhecimentos tradicionais”. Os indígenas esperavam a criação de um sistema de regras mundiais para as pesquisas com plantas e animais, que, segundo eles, se apropriam do saber dos indígenas, quilombolas e extrativistas. Fóruns indígenas anteriores e também a Declaração Internacional de Cancún dos Povos Indígenas, já demonstrava a preocupação dos povos indígenas com esta questão da distribuição de benefícios. Na Quinta Conferência Ministerial da OMC em Cancún em setembro de 2.003. A proposta do Fórum é que haja mecanismos de repartição dos lucros e tecnologia com as comunidades locais. Os povos indígenas dão o nome de Biocolonialismo a esta decisão dos governos agir sobre as suas milenares práticas que começaram a atrair a atenção do homem branco. Segundo o Conselho dos povos indígenas a ênfase na “distribuição de benefícios” tem o efeito de promover ao invés de prevenir, a comercialização dos recursos genéticos. Ainda que a distribuição de benefícios ajude mais os povos indígenas que a biopirataria, apresenta iguais e sérios riscos. Segundo este conselho as vozes dos povos indígenas em todo o mundo estão a questionar a engenharia genética, denunciando os atos de biopirataria e reivindicando os direitos a proteger as comunidades e o meio ambiente contra os depredadores da genes. As iniciativas e forma de

vida dos povos indígenas continuará demonstrando ser uma alternativa de em uma era de globalização que trata de monopolizar e comercializar todos os recursos da vida.

Para os participantes do Fórum Indígena, o único avanço da COP-8 foi manter a proibição absoluta (estabelecida em 2000) para pesquisas com tecnologias genéticas de restrição de uso da Tecnologia Terminator – que diz respeito a plantas que foram geneticamente modificadas para produzir sementes estéreis na colheita, através de mecanismo molecular induzido. Desenvolvida pela indústria multinacional de sementes/agroquímicos e o governo dos Estados Unidos para evitar que agricultores guardem e replantem sementes colhidas que foram desenvolvidas pelas corporações de biotecnologia e de sementes.

O Greenpeace avaliou a COP8 como um fracasso. E a falta de avanço, segundo a organização compromete seriamente as metas definidas pela própria Convenção de reduzir a perda de Biodiversidade até 2010. O adiamento da lei sobre Repartição de Benefícios segundo Paulo Adário, coordenador da campanha Amazônia do Greenpeace, ganhou-se tempo para que a indústria farmacêutica, especialmente dos Estados Unidos, etiquetasse e colocasse a biodiversidade em código de barras.

A discussão sobre o papel da conferência em identificação de reservas marinhas em alto-mar não avançou.

Em resumo, a COP8 como avanço pode comemorar apenas a permanência da proibição do uso das Tecnologias de Restrição de Uso Genético – GURT’s, ou Terminator.

Este tema relativo aos Terminator entrou no tema da convenção este ano. Este e outros temas terem entrado na agenda é visto como um avanço na luta contra a perda da biodiversidade. Pelo Brasil foi trazida a iniciativa de mapear as espécies de animais e plantas exóticas invasoras. Segundo a ONU, tais espécies dão um prejuízo de US$ 1,4 trilhão, sendo a primeira causa de redução de biodiversidade em ilhas e a segunda nas demais regiões do mundo. Entre os invasores estão arbustos, aves, peixes, répteis, e vírus exóticos.

Em 2008, na Alemanha, a COP9 terá como pauta uma gama enorme de pendências, a dois anos da meta estabelecida para que se reduza a perda da Biodiversidade no Planeta.

Certa vez eu escrevi que as ONGs e os Médicos sem Fronteira e os membros do Greenpeace eram os poetas do Terceiro Milênio. Nada poderá ser narrado se a Terra estiver ressequida e nua.

Os povos da floresta parecem ser os únicos que tem noção da importância deste precioso vínculo com a Mãe Terra, e eles, até mesmo eles são parte desta extinção vagarosa e estranha, e o homem branco, globalizado, com um código de barras na alma talvez não compreenda o que Marcos Terena disse:

– Posso ser quem você é sem deixar de ser quem sou.

Considerando a luta em todo o mundo, incansável e sem trégua, o feito de muitos integrantes que acabam presos em manifestações que buscam alertar os homens. Esta minha pequena passagem pela MOP/COP fez com que eu me lembrasse de um poema que fiz em 1.999 para esta organização, que se denominava, no início – Guerreiros do Arco-Íris.

 

 


GUERREIROS DO ARCO-ÍRIS

 

 

Quando secarem as fontes

E a terra estiver ressequida e nua

O mundo se lembrará dos guerreiros do arco-íris

 

Quando o verde desaparecer

E o último pássaro migrar

Em busca

Da última folha

Da última árvore

Da última floresta

A humanidade saberá

E – tarde demais - acordará

 

 

 

 

Karuguá – em guarani significa Arco-Íris.

As informações sobre o Fórum Indígena em Cancun, em 2.003, foram retiradas do livro – Guerra de Paradigmas – Resistência de Los Pueblos Indígenas a la Globalización Econômica – editado por Jerry Mander y Victoria Tauli Corpuz.

 

 #COP8

#memories2006

#barbaralia

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