Monday, May 04, 2009

O mundo é uma igreja pequena

Há três de mim. Há o cenário: Uma igreja pequena. Há os atores: Pálidos e mumificados ouvindo a voz do pregador. Há um perfume de incenso e há um coro que só canta quando o pregador acena, levanta a mão, maestro tosco. Há um ranger de madeira de bancos velhos, mas não ouço o ranger de almas. Minha alma range desde que eu era menina. Hoje vivo à direita de mim, livre. Já escapei do cenário. Eu disse – Há três. Uma que todos vêem em pé, esgueirando-se pelas paredes onduladas do templo. Uma que está ali sem estar, a viver como uma obrigação, para não ferir quem a ama, fica ali, ouvindo as pregações. Ajoelha, arrepende, reza, comunga e até canta. Há aquela que está no limbo. Uma névoa líquida fria e esponjosa que envolve em uma dança estranha, quase bonita, quase assim aquele retrato de Isadora Duncan. Voando entre o tecido, linda. No limbo não sou feliz, no templo não sou feliz. Só a terceira que esgueira para fora e explode o peito de ar limpo e azul, esta que ninguém vê. A invisível. A invisível é feliz, esta que ninguém conhece. Que ninguém chicoteia como ao Cristo. Que ninguém julga: Pilatos aos borbotões. Esta que ninguém prega na cruz. A que as suas sementes conhecem e a amam. Aquela que o amado eleva ao éden na casa da chuva e a ama. A terceira é o ar o azul o pássaro a cópula o colo maternal a misantropa. A terceira que ninguém conhece. A terceira que só os que amam conhecem. O frio ondulado das paredes causa artrite. Toca o sino e a hóstia é erguida. Sacrifício. Vou ter que ficar aqui.

Bárbara Lia
4/5/9

La nave va...

Um dedo de prosa

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