Friday, June 12, 2015

As Filhas de Manuela - Bárbara Lia




"Grande Mar Redondo.
Pernaguá.
Paranaguá.
Baya de La Corona de Castilha.
Vila de Nossa Senhora do Rocio de Paranaguá.
Vento.
Ar branco da solidão.
Manuela congela as mãos na bacia de bronze e vê a cor rosácea do dorso das mãos como se um fogo brando a cobrisse a cada manhã quando lava as roupas nos fundos da casa. Nas manhãs percorre a distância entre a casa e o riacho, calmamente entre os cascalhos barulhentos, e sente a delícia de estender o corpo por alguns minutos na grama macia ao lado do rio pequeno que corta o fundo da propriedade. Ama aquela tarefa que a afasta da casa e da bagunça dos irmãos. Seis irmãos homens e ela, só ela de mulher. Única Flor. Filha deslocada entre o bando de meninos. Sempre incomodada onde quer que esteja - na casa, na venda, na pequena Igreja onde a mãe deita a novena no vácuo das paredes rudes acompanhada por uma ou duas senhoras que rezam por seus maridos e filhos - marinheiros atirados ao mar. O último dia de novena foi repleto de uma só palavra – Julião. O Julião Preto. O filho da Maria do Amparo Preto. A mulher que esperava pelo rebento extraviado que viria lá dos confins da costa do País. Desceria em uma embarcação pelo mar rançoso, chegaria com seus olhos - que a mãe dizia – de esmeraldas. Sentiu um arrepio ao perceber a amarração que faziam da sua vida e a do marinheiro desconhecido nas entremeadas contas a valsar entre os dedos – sua vida e a vida do moço - entre uma e outra Ave-Maria."
Bárbara Lia
As Filhas de Manuela
Menção Honrosa no Prémio Literário Fundação Eça de QUeiróz
Imagem - Paranaguá - Jean Baptiste Debret – 1827

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