Com
elegância vivemos nossos amores e desejos e seguimos, como as palomas que não
se preocupam com o risco de fogo que fica por onde se passa. Este risco que
dilui suave como lágrima de deusas etéreas. Temos boca para beijos e temos o
olhar negro de graúna, ou da jabuticaba, ou de mulheres que levam a amplidão
das noites coaguladas dentro de um espaço onde viver pode doer, mas ao mesmo
tempo, expande a beleza de tocar as rosas escondidas nos desertos densos onde
nada pode durar mais que quatro horas sem secar ao sol.
Em
alguns dias não queremos nada ou ninguém ao redor, então enleamos o silêncio
como um rito ao enlear nossos xales em nossos ombros. Ancoramos no espaço onde
existimos únicas e onde nem o amado mais amado penetra. Neste lugar onde
ficamos com o invisível e nos ausentamos para tocar alguma aurora reticente
onde apenas moram as mulheres de Sol.
Temos
cabeça, mãos, pés e coração. Qual no quadro de Klee podemos nos desdobrar e
romper-nos e espalhar-nos pelas superfícies. Parecemos bonecas dos natais
antigos às quais desmembrávamos curiosas para saber mais, seguimos
desmembrando-nos para depois juntar-nos. Mesmo nossa Arte espalha-se em
fragmentos. Minha Poesia – toda ela – é fragmento meu. Para formar um quadro
inteiro com meu corpo e coração e mãos e lábios, há que se ler todos os meus
versos. Tuas telas são pequenas tiras de uma história e para saber tudo é
preciso colocá-las em sequencia para ler tua vida e saber tudo. Não se sabe
Frida a partir de um único quadro.
Bárbara Lia
(de um livro em construção)
Has a head hand foot and heart - Paul Klee