Sunday, March 21, 2010

Dia de Lorca

José do Carmo Francisco (Portugal)  enviou-me hoje - Dia Internacional da Poesia -  uma bela poesia para Garcia Lorca, que publico logo abaixo. Sincronias. Hoje eu estava embasbacada lendo um pequeno fragmento de uma poesia de Lorca - no livro - Bodas de Sangue - Um belo prefácio que finaliza falando da conferência que Lorca proferiu em Havana em 1930...
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"Segundo o poeta "duende" é um tipo de poder oculto capaz de falar através  de todas as formas de arte, inclusive da arte da personalidade. "É força e luta; não se trata de idéias ou temas; ou o temos dentro de nós, ou não o temos, o 'duende" vem de dentro, desde a sola dos pés." "Duende" seria carisma, magnetismo, encanto, graça e, ainda "não sendo anjo nem musa, é descendente daquele melancólico demônio de Descartes e do daimon socrático benigno, palpitante, o alterego, em suma"; é aquilo que Goethe dizia ser "um poder misterioso que todos sentem e nenhum filósofo explica". "Solo se sabe que quema la sangre como um tópico de vidrios, que agora, que rechaza toda la dulce geometria aprendida, que rompe los estilos. (...)"
Ao discorrer sobre o conceito em Havana fica clara a consciência do próprio gênio , que Lorca, aliás, já sintetizara em outros versos:

Por que nasci entre espelhos?
O dia dá voltas ao meu redor
E a noite me copia
Em todas as suas estrelas.

Presente na sua obra e na sua personalidade de forma avassaladora esse "duende", como atestam as palavras de Luis Buñuel, decorridos trinta anos da morte do poeta:

- De todos os seres humanos que já conheci, Federico foi o mais impressionante. A beleza fluía dos seus lábios. Ele era a paixão, a juventude, o amor. Era como uma chama.
Bodas de Sangue - ed. Peixoto Neto Prefácio de Ilka Marinho de Andrade Zanotto
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Sobre o livro - O que é Poesia? Um comentário do José do Carmo Francisco - aqui.




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Lorca no caminho do Montijo


Era pelo Inverno de cinquenta e sete.
No Porto Alto um homem de capuz e oleado
segurava uma lanterna com dois vidros pintados
e fazia alto com a outra mão.
A ponte sobre o Sorraia era de madeira
e só passava uma camioneta de cada vez.
Não havia ao tempo muitas Mercedes Benz
de cor verde e com a chapa do Estado.
Meu pai saudava o homem entre a chuva
e desejava-lhe uma boa noite impossível. 

Se recordo estes passos e rituais
dos caminhos desse tempo
é porque aquele lugar marcava para mim
o principiar da circulação de uma temperatura
que me fazia lembrar Lorca.
Eu tinha aprendido a ler nos jornais.
Meu pai trazia-os à noite para casa.
Terá sido num «Diário Popular»
que li um texto sobre o poeta assassinado.
Mesmo sem conhecer os seus poemas
comecei a sentir naquele espaço
a respiração do verde e do vermelho,
a relva sem fim e o sangue dos touros,
o pó levantado pelos cavalos breves,
os gritos dos campinos sempre longe
e a noite sempre negra e sempre longa.

Mais à frente, a caminho do Montijo,
respirava o sal de Alcochete,
o sabor conservado de uma angústia serena,
a ideia imaginada de que estes campos verdes,
estas oliveiras e este som da alegria
rente à raiz de tudo
poderiam ter sido caminho
do poeta Federico Garcia Lorca.

Ainda hoje não sei porque cavaram
tão depressa os cabouqueiros da morte.
Sei que entre o Porto Alto e o Montijo
algures entre verde e verde
uma sombra esguia faz sinal aos deuses
e os deuses param.
Lorca poderia ter morrido aqui
à porta desta taberna, a caminho do Montijo.
José do Carmo Francisco

http://www.triplov.com/poesia/carmo_francisco/index.htm




Lorca en mi corazón (Bárbara Lia)

Gazal de espumas
treze constelações rimadas
clave de Fá escondida
na estrela mais clara

Touro triste dança
ao manto de mariposas
vomita rosas, chora arraias

Lua desfia-se
incinera seus raios
em luto andaluz

Corcéis golpeiam
o vento perfumado
que acariciou o poeta
em noites lendárias:

Cinzas levitam
acima do fogo eterno:

Lorca en mi corazón

La nave va...

Um dedo de prosa

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